Filadélfia
Filmes LGBTs sempre formaram um nicho específico. E isso não
impediu de se fazer ótimos filmes. E antes de “Filadélfia” muitos atores faziam
filmes gays e se estigmatizavam. Pelo menos
é o que recordo através de minha memória limitada. Então “grandes” atores
evitavam associar seu nome a “certos” nichos e produções. Até que Tom Hanks
decidiu fazer esse filme com Denzel Washington. Tudo bem que o então Hanks
configurava mais como um ator comediante de filmes leves e simpáticos, e Denzel
era um “coadjuvante” negro que não
conseguia espaço na indústria cinematográfica. Porém algo já indicava que esse
filme seria um tanto diferente, o diretor era Jonathan Demme. Esse diretor para
quem não lembra ou não sabe conseguiu a façanha de ter um filme ganhador das 5
categorias principais do Oscar – Melhor Filme, Diretor, Ator, Atriz, Roteiro
(adaptado) – feito que não acontecia há cerca de 15 anos: “O Silêncio dos
Inocentes”.
Com realizador de tamanho peso uma história de segmento gay
tomava outra proporção. A história era interessante o suficiente para chamar a
atenção de produtores que sempre pensavam pelo lado do óbvio e lucrativo. E o
roteiro de “Filadélfia” não era óbvio. Falava de temas delicados que
afugentavam o público médio americano: gays e AIDS.
E o reconhecimento veio, porém menos prêmios que o esperado.
Denzel mais uma vez preterido e Hanks alçado ao estrelato e levado a sério como
ator capaz de interpretar drama através do advogado Andrew Beckett que,
portador do vírus HIV, começa a manifestar a AIDS (legenda inglesa para a
Síndrome da Imuno Deficiência Adquirida).Na história seus chefes desconfiados o
mandam embora forjando um inapetência técnica.
Para se fazer valer seus direitos vai atrás de um advogado que assuma
sua causa. Pelo processo ser contra um grande escritório de advocacia ninguém
quer pegar o caso. Sem contar nas implicações que o caso causaria, Andrew é gay
e tem uma doença temida e pouco entendida na época. Se hoje o HIV foi
controlado com medicamentos e a AIDS não se manifesta de forma mortal em meados
dos anos de 1990 era ainda um flagelo que ceifava a vida dos portadores. E
vemos essa ignorância, no sentido de não conhecer e também de agir de forma
escrota, no advogado Joe Miller (Denzel) que sendo heterossexual não sabe do
universo gay e se incomoda com a doença de Andrew. Até se informar um pouco
mais e ver com os próprios olhos o preconceito vir à tona contra Andrew numa cena na biblioteca pública.
Por fim aceita o caso e vemos um show de interpretação que culmina numa cena
que até hoje me arrepia apenas por lembrar.
Ambos estão estudando o caso e vendo como agirem diante do
tribunal e ao fundo ouvimos uma opera. É Maria Callas interpretando a ária do
terceiro ato da ópera “Andrea Chérnier” de Umberto Giordano, “La Mamma Morta”. Como
é de esperar, Joe não conhece muita coisa de ópera. Andrew vai tentar explicar
o sentido. Joe não entende a língua que
a ópera é cantada, Porém, é capaz de entender o sentimento envolvido, só não é
capaz de deixar suas barreiras heterossexuais e machistas de lado para se
permitir sentir. Andrew está debilitado pela AIDS e atrelado a um soro em seu
pedestal que forma um macabro parceiro de dança. A música aumenta, as luzes
tomam o tom avermelhado do sangue, da paixão, a vida que Andrew está perdendo.
Joe tem sua, até então levantada, guarda quebrada. A ópera é catarse de Andrew
e Joe percebe que a sua frente não é um gay, não é um cliente não é um “aidético”,
é um homem que ama viver e está morrendo e seu único conforto é desfazer a
injustiça que lhe acometeram. Andrew não explica a música, ele vive a música,
em cada som, em cada verso, em cada respirar de Callas. Joe se convence ali que
indiferente a qualquer coisa, preconceito ou falta de informação, Andrew
precisa ser compreendido e aceito. Guardas no chão e Joe vê a magnanimidade do
que tem a sua frente. Se há tensão ali não é a sexual e sim a tensão de um
homem comum diante de um homem extraordinário por sua condição. Joe percebe o
óbvio e segue adiante lutando a favor de Andrew.
Direção: Jonathan Demme
Música composta por: Howard
Shore
Canção original: Streets of
Philadelphia
Prêmios: Oscar de Melhor Ator,
mais
Elenco:Tom Hanks, Denzel Washington, Antonio Banderas,
Jason Robards, Joanne Woodward e outros.
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