Alô, alô, galerinha! Tudo que bem, bem-bem-bem-bem-bem-bem?
Tudo que mal, mal-mal-mal-mal-mal-mal-mal? Ehr... Isso não funciona muito bem
no texto como funciona na fala. Contudo dá o tom da resenha de hoje. Demorei mas
aqui estou. Como sempre, trabalho consome nossa alma... Maldito sistema
capitalista exploratório... Ops! Sou contratado pelo governo do estado para dar
aulas... Maldito sistema político capitalista predatório! E não, não podemos
falar que somos capitalistas neoliberais, pelos últimos desdobramentos nefastos
estamos mais para medievais. Entrei para um episódio de Black Mirror macabro
misturado com House of a Cards e American Horror Story Brazil Freak Show.
Depois que passou o arrebatamento e o afã em torno do
filme é que eu decidi escrever. Eu nem ia, mas de bobeira aqui decidi.
Basicamente tudo que vocês leram é verdade. O Joaquim Phoenix está phodástico.
O filme é cheio de virtudes e o roteiro é ótimo. E as críticas também são
verdadeiras. Humaniza-se tanto o vilão que ele fica uma pessoa normal quase impossível
de se acreditar que se tornará o lorde do caos e da loucura que dará tanto
trabalho ao Batman. Sem contar que enfiar o recorte da morte dos pais de Bruce
Wayne ali no meio da algazarra toda me soou um tanto forçado. Eu entenderia um
rico num cinema de rua nos anos de 1940-1950. Já numa indefinível década de
1980 não. Mas as virtudes são mais fortes e foque nelas, é o que um coach
diria.
E virtudes não faltam. Todo o elenco está
afinadíssimo, e o roteiro impecável, tirando a parte do casal Wayne como já
disse. Mas retratar o patriarca como um “empresário” político é uma boa sacada.
Ainda mais com o atual presidente de lá dos EUA. E também colocar a
transformação de um Zé-Mané qualquer em Coringa é outra sacada boa,
principalmente pelos motivos complexos que essa “transformação” envolve:
traumas de infância, patologias mentais, falta de empatia das pessoas que o
cercam de forma geral, e o mais aterrador e devastador e pervertido de todos os
motivos, a falta de programas governamentais que deem apoio e suporte a alguém
em situação de vulnerabilidade como Arthur se encontrava.
O estado e a
sociedade criou o Coringa. Era evidente e claro que ele precisava de
acompanhamento, era evidente e claro que sem os remédios ele traria problema,
era evidente que ia dar muita merda. Na vida real poderia desencadear algo mais
subjetivo e intimista, contudo o filme pretendeu mostrar a grandiloquência da
personagem espalhafatosa que acaba servindo de catarse para a insatisfação
popular. Ali, após os assassinatos dos três “caras de bem” no metrô e do
assassinato ao vivo do apresentador Murray Franklin/Robert De Niro, vemos o
narcisismo e exibicionismo do vilão que conhecemos. Vemos o que pode ser o
início do terror do Homem Morcego, não antes, não durante só após o inferno já
estar ardendo que percebemos o poder de fogo que o Coringa causa. É um estopim,
ele atrai os revoltados, insatisfeitos e, porque não, os lúcidos/loucos que
percebem que algo não anda bem no que a direita/poderosos propõem. Esse “american
way” não está dando mais certo e o filme mostra isso numa luta de classes
apoteótica ao fim.
Apesar da maceração de Arthur vemos um momento de extremo
lirismo, e não tem como não comentar: a estranha dança dentro do banheiro após
fugir da cena da morte dos três “cidadãos de bem” no metrô. Aquilo é de
arrepiar os ossos de tão Belo, sim com letra maiúscula para citar o sentido
filosófico mesmo. Basicamente o filme é duro, cru e bem “feio” nas escolhas de
luz, figurino, época e lugar retratados. É tudo sujo demais, urbano demais,
anos 80 demais, violento demais e vem a dança estranha que destoaria de tudo
por seu lirismo. A alma do palhaço tomou conta da alma de Arthur e mesmo no
caos e feiúra do mundo esse palhaço faz seu espetáculo como um artista que é,
busca apurar sua técnica, mesmo sua arte sendo da destruição e tida como do
mal. O palhaço é sensível e mostra isso naquele instante em que nasce.
Uma
sensibilidade que é fruto da mais fria psicopatia engatilhada pelos fatores
citados lá em cima. Engatinha nos movimentos do corpo um pouco deformado de
Joaquim e fica ótimo na tela. A câmera o segue fascinado. É o momento crucial,
ali o filme me ganhou e me fará lembrar como a melhor produção desse
catastrófico ano de 2019.
Nenhum comentário:
Postar um comentário