Garota Dinamarquesa e 45 Anos: Franqueza Inexistente e Existente
A
diferença entre “Garota Dinamarquesa” e “45 Anos” é a franqueza existente em um
e inexistente no outro.
“Garota
Dinamarquesa” conta a história de como o pintor Einar Mogens Wegener (Eddie
Redmayne), com uma “ajuda” de sua esposa Gerda (Alicia Vikander), se
“transforma” em Lili Elbe. É uma história de descoberta de gênero. Um homem,
que reprimido pela sociedade, assume papel imposto e que em determinado momento
descobre que seu gênero verdadeiro não condiz com seu corpo biológico e começa
a se vestir de mulher e por fim tenta uma cirurgia, a primeira da história, de
mudança de gênero, o que hoje é chamada de Cirurgia de Redesignação Sexual.
Em
si mesma a história é bem interessante. Porém, nas mãos de produtores
americanos preocupados em pasteurizar tudo, ficou insossa. Vários fatos
históricos e relevantes ficaram de fora para pintar uma imagem bem mais
encantada do que realmente aconteceu. Sem contar que os críticos protestaram
por um ator cisgênero (pessoas cujo gênero é o mesmo que o designado em seu
nascimento – informação by Wikipédia) fazer o papel de uma pessoa transgênera (condição
onde a expressão de gênero e/ou identidade de gênero de uma pessoa é diferente
daquelas atribuídas ao gênero designado no nascimento – informação by Wikipédia
– usei para ficar mais certinho na explicação).
O meu “porém” está, não só
nesses pontos, mas também na questão da atriz Alicia Vikander ser considerada
coadjuvante. Sendo que ela carrega mais da metade do filme sozinha na sua
atuação. Do jeito que o roteiro foi formulado dá a entender que a “Lili”, não
só estava “presa” dentro de Einar, mas também foi uma “construção” de Gerda. E
isso a torna uma protagonista na história da “Garota Dinamarquesa” e só para
concorrer a uma estatueta/jabá a delegaram o título de coadjuvante. Por isso
não há “franqueza” nesse filme. Tinha tudo para ser contraventor, inusitado e
revelador e não foi. É triste ver uma história dilacerada e estragada pela
produção que tem medo da reação do público médio.
Por
isso acho que “45 Anos” acaba sendo mais verdadeiro, apesar de ser baseado em
ficção, do que “Garota Dinamarquesa” que tem por trás fatos reais. Com uma
premissa “bucólica”, “45 Anos” faz um questionamento bem profundo sobre o que
vem a ser realmente um relacionamento, o amor ou ainda se a memória de alguém
do passado pode levar a uma traição no relacionamento. Para entender melhor:
Kate e Geoff Mercer vão fazer 45 anos de casamento. Por Geoff ter ficado doente
na época dos 40 anos de casório eles não fizeram festa. Já melhor de sua doença
Kate decide fazer a comemoração com os amigos e parentes. Idosos, sem filhos
eles levam uma vida calma e aparentemente sem segredos.
Há cerca de cinco dias
da comemoração, Geoff recebe uma carta informando que o corpo de sua namorada
desaparecida há décadas foi encontrado numa geleira nos alpes. Como ele tinha
dado a informação que eram casados na época, ele acabou sendo o único contato
para se mandar o comunicado de óbito. Geoff fica abalado pois a garota foi seu
primeiro grande amor. Um tempo depois conheceria Kate com quem acabou se
casando. E isso causa uma crise no casamento dos dois. Kate passa a ter dúvidas
e Geoff fica obcecado com a situação. Aí está a franqueza, numa aparente
calmaria com pessoas normais o acaso faz brotar sentimentos que até então não
existiam, ou estavam submersas no inconsciente, histórias escondidas são
reveladas e questionamentos existenciais sobre a relação dão outro tom ao desfecho.
Se
no “Garota Dinamarquesa” a interpretação de Vikander é o que dá sustância ao
filme em “45 Anos” o casal vivido por Tom Coutenay, o reticente e confuso
Geoff, e Charlotte Rampling, a atordoada e magoada esposa Kate, são ótimos. Por
mais que Rampling consiga mais brilho não tem como não considerar seu parceiro
em cena como menos digno. A história é dos dois até o fim. No outro filme a
história é de uma, a “garota” dinamarquesa, porém, é através de outra, Gerda,
que tudo se desencadeia. E quem é que deveria ser a principal perde espaço para
uma suposta “coadjuvante”.
Como
disse a interpretação de Vikander é bem melhor que de Redmayne, que não dá
fôlego suficiente a Lili. Já Charlotte Rampling arrasa. Sempre achei que fazer pessoas
comuns verossímeis o exercício interpretativo mais difícil de atores e atrizes.
E sua Kate é soberbamente uma pessoa simples.
Porém,
não ache que “45 Anos” é uma história simplória, pode ser simples mas tem
desdobramentos sutis e complexos. Até um suspiro no finalzinho não é apenas um
suspiro. Já “Garota Dinamarquesa” falha, por mais “bonitinho” que possa parecer
e tem a profundidade de um prato.
E o
Oscar???? Se ano passado estava preocupadíssimo em assistir a todos os
indicados nesse ano só tenho a dizer: “DANISH” O OSCAR!!!!!!
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