terça-feira, 5 de janeiro de 2016

Tangerine: "[...] vai depender do tanto de mente aberta que se tem."

Tangerine: "[...]vai depender do tanto de mente aberta que se tem."





Sabe quando você ouve falar de um filme que é bacana e descolado, que fez algum rebuliço no Festival de Sundance por algum motivo e até chamou atenção de alguma celebridade por alguma questão social relevante qualquer? E você pensa: “Que legal, vou assistir”. Passam-se messes e, um dia, cansado das mesmices hollywoodianas você se recorda do filme e dá uma chance e o assiste??? E ele se mostra como um filme “dukaraleo”?

Bom, Tangerine pode ser um desses. MAS vai depender do tanto de mente aberta que se tem. Em vários sentidos. Principalmente na questão sexual a que se reporta...

O filme tem uma história relativamente simples, ao mesmo tempo contraventora e é de vanguarda. Parece um modismo discutir a questão de gênero. Porém é algo que se faz necessário principalmente pelo número alarmante de transexuais que são mortas ou se suicidam no nosso país e no exterior. Principalmente devido a pressão que a sociedade hipócrita cria  nessas pessoas, marginalizando-as e fingindo que elas não existem.

O roteiro conta como Sin-Dee Rella (a “estreante” Kitana Kiki Rodriguez), nome de “trabalho” de uma transexual (que o brasileiro simploriamente chama de travesti), sai da prisão, depois de um mês, por ter sido pega com as drogas de seu namorado que também é cafetão. E reencontrando-se com sua amiga Alexandra (outra estreante: Mya Taylor) descobre que seu namorado está com outra mulher, só que  cisgênero (homem ou mulher que não sente a necessidade de mudar de sexo). Eu estou tentando explicar direito, e morrendo de medo em incorrer em alguma gafe. Pois não é uma terminologia fácil e anda mudando consideravelmente nos últimos anos. Por isso, desde já, se falei alguma besteira quanto aos termos me corrijam por favor nos comentários abaixo. Ao descobrir a “traição” do seu boy, Sin-Dee resolve tirar satisfação com a garota, que descobre se chamar Dinah (Mickey O’Hagan), fazendo uma acareação com seu amor Chester (James Ransone). Então, com a ajuda da relutante Alexandra, começam a vagar pelas ruas atrás do namorado “infiel” e da “amante piranha”. E no meio de tudo isso Alexandra terá uma apresentação em um bar e é véspera de Natal. Sem contar que para garantir o pagamento de seu show ela precisa ainda fazer dinheiro nesse dia. Sim, “o fazer dinheiro" é através da prostituição. E aí que entra o chefe de família, trabalhador e respeitável taxista Razmik (Karren Karagulian) que gosta de se divertir com a rola de uma Trans (forma de abreviar transgênero). Então, imagine a confusão instaurando-se.


O que chama atenção nesse filme em primeiro lugar é a forma que as personagens Trans são retratadas. Não de forma desrespeitosamente caricatural. Não há esteriótipo deturpado, há a humanidade por trás de pessoas que se sentem deslocadas no próprio corpo a ponto de assumir uma identidade diferente do que seu biológico determinou. O filme não é uma comédia de riso fácil. Pelo contrário é um drama sensível sobre as dificuldades de ser algo que a sociedade hipocritamente finge não existir. É bem relevante então que o taxista Razmik procure os serviços sexuais de Alexandra. Pois se há prostituição, seja masculina, feminina ou Trans é por haver quem se interesse. E, geralmente, estão afoitos por esse "mercado" homens casados, de família tradicional, pessoas de bem e cristãs... Pois éh!!!!!!


         Lá no começo do texto eu citei que uma celebridade tinha se interessado pelo filme. Ninguém menos que Caytlyn Jenner andou tentando ajudar Mya Taylor a ter uma indicação ao Oscar. Até agora nada aconteceu... Ela está fazendo sua parte. Se não sabe quem é Caytlyn Jenner, procura no Google para ter uma surpresinha bem interessante.

         Se tudo isso não bastasse para fazer um filme interessante, existe uma inovação técnica por trás. Pasmem, quem não sabe ainda, o filme todo foi gravado através das lentes de um IPhone 5. Na verdade, parece que usaram três aparelhos para revezar nas filmagens. Sim, o filme todo feito com celular. Com uma câmera específica que é disponibilizada pela própria marca, um equipamento para segurar melhor o aparelho e ajudar a amenizar a trepidação e um aplicativo de tons das cores da imagem baixado por cerca de U$ 8,00. Tanto que para tirar o efeito de “vídeo de celular” eles usaram uma saturação de cores dando a predominância ao tom alaranjado. Surgindo assim o nome do filme “Tangerine”.

         Então deu para entender o rebuliço no festival de Sundance. Um filme com uma qualidade inquestionável, uma fotografia bem executada, com planos de câmera bem interessantes feito apenas através de celulares, aplicativos e acessórios disponíveis no mercado. É um feito realmente espantoso dada a qualidade técnica do filme.

         Inovador no tema, inovador na técnica o que já garante a necessidade de um bom apreciador de filmes em assisti-lo.  A diversão vai ficar por conta do tamanho de nosso preconceito. Quanto maior, menos se gostará.... E se isso acontecer é hora de repensarmos um pouco nossa postura como ser humano... 2016, já passou da hora de evoluir em algumas questões sociais que estão na nossa cara e insistimos em não ver. 



Nenhum comentário:

Postar um comentário