Quando eu tinha 9 anos, como muitos brasileiros de minha idade, era tão grudado na televisão que não perdia quase nenhuma novela da finada, por minha parte, Rede Globo. Hoje em dia eu assisto esporadicamente algum corte em algum programa pelo Instagram, mas assistir mesmo — de sentar no sofá, apertar o botãozinho vermelho do controle remoto e ficar o tempo inteiro, por livre e espontânea vontade, diante da TV aberta — é muito raro. E, quando acontece de haver algum interesse em algum programa específico, eu vou a alguma plataforma, como é o caso do YouTube.
E por qual motivo isso é relevante nessa crônica? Porque esse é justamente o grande problema que a televisão aberta tem, mas não admite. Muita gente, com o acesso fácil à internet, costuma selecionar o que vai assistir porque pode. Em 1987, quando estreou Sassaricando, não havia grandes concorrências — ou mesmo não havia nenhuma. A Globo era monopólio, principalmente em relação à produção de novelas.
Recentemente tivemos um remake dirigido e roteirizado de uma forma que não chegou aos pés do que pedia a obra original, que foi Vale Tudo. E não vou entrar no mérito de gostar ou não; o que quero dizer é que, por ser uma obra canonizada pelo público, refazê-la em tempos de inúmeras plataformas exige, no mínimo, uma certa reverência pelo material original e o desenvolvimento de uma trama tão exemplar quanto a de 1988. Se há concorrência, é necessário produzir algo que não brinque com a capacidade do público de perceber que o produto está sendo feito com baixa qualidade. Foi-se a época em que todo mundo parava para assistir a uma novela — principalmente quando ela não era tão boa e não prendia a atenção do público. E a Globo anda um pouco perdida no rumo do que quer fazer: quer produzir enlatados, seguindo fórmulas batidas, sem qualidade e não entende por qual motivo não faz sucesso. Acho que a última novela que me chamou atenção foi Avenida Brasil, em 2012.
Outra coisa que nunca entendi foi o motivo de a Globo não disponibilizar antes as suas novelas, seja em DVD, seja em um canal próprio. Isso só aconteceu muito tempo depois, quando apareceu o streaming. Ela segurou tanto por medo de pirataria, como se isso adiantasse. Houve uma tentativa de reviver novelas antigas com o canal Viva, que tinha suas limitações — não estava disponível para todo mundo. Ela perdeu muito tempo com a falta de administração de seus próprios conteúdos e com a oportunidade de trabalhar seu catálogo como a Disney faz com seus clássicos, que continuam rendendo o máximo possível.
E é aí que entro em Sassaricando. Quando a Globo disponibilizou as novelas para assistir no seu streaming, eu comecei a me interessar, mas havia tantas coisas inéditas interessantes que eu sempre deixava para depois. Sem contar que ou você escolhe um ou outro, senão seu salário fica todo com eles. E mesmo com um streaming bom, com um catálogo sortido, temos aquela sensação de “não tem nada para ver”. Eu já percebia isso quando trabalhei numa locadora, na adolescência — estava o tempo todo em contato com os títulos e, mesmo assim, parecia que nada era interessante. E, em um desses momentos de dificuldade para escolher algo, me ocorreu a ideia de assistir Sassaricando até tomar conhecimento de algo que me interessasse. E que delícia tem sido a experiência.
O lado gostoso aparece quando, reassistindo, puxo minha memória e comparo o que realmente lembro com o que realmente é. Outra coisa é ver São Paulo — uma cidade pela qual tenho bastante carinho e amor, e onde infelizmente não estou morando no momento — nas cores, modas e lentes daquela época. E, por fim, dar um refresco em tramas mirabolantes ou pesadas demais com um produto de humor leve, brasileiro. Tem realmente sido um respiro. E, com a minha cosmovisão atual, percebo camadas que uma criança de 9 anos não percebia.
Estou adorando ver Tônia Carrero encabeçando o trio com Eva Vilma e Irene Ravache num arco inspirado em Como Agarrar um Milionário. Ou mesmo o arco de Aparício Varela (Paulo Autran), Teodora e Fedora Abdala (Jandira Martini e Cristina Pereira) e a Camila lindíssima com uma jovem Maitê Proença em seu resplendor de olhos penetrantes. E tantos outros atores que eram muito constantes nas telinhas e, com o tempo, foram desaparecendo — seja lá o motivo. E, se você der uma olhada mais maliciosa, em alguns momentos existe um subtexto bem camuflado que é delicioso. Autores bons fazem isso.
Claro que não deixei de assistir nada dos estadunidenses, mas é bom dar um respiro. Valorizar algo que é nosso. E, apesar de alguns desastres, temos sim produtos cinematográficos ou televisivos muito bons. Infelizmente, percebo que a senhora emissora referida, ao criar seus outros canais na televisão paga, tem deixado a desejar na televisão aberta. E nem vou falar da chatice que está virando um grupo aí, que me recuso a citar pelo nome, boicotando qualquer coisa porque “é contra os costumes, a família e o bem absoluto”. Arte, mesmo a comercial, não deve se render a grupo nenhum. Tem sim que apresentar algo da sociedade e mesmo criticiar.
Eu até hoje não vejo nossa cultura realmente explorada em uma séries — novelas, então, nem pensar. Sempre camuflando ou evitando. Sei que Carmen, exibida em 1987 na extinta Rede Manchete,
ousou um pouco nessa vereda. Por sinal, preciso assistir. E temos também Xica da Silva, bem ousada na época.
Usar essa ideia de ir assistindo novelas antigas enquanto aguardo uma continuação ou não me me interesso por nada tem me prospiciado momentos divertidos. Afinal não assistimos nada para simplesmente odiar, no mínimo eu quero amar odiar.
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