quarta-feira, 30 de novembro de 2016

Gabriel e Iago V - A Viagem

Gabriel e Iago V - A viagem






Para quem não se lembra do início aqui estão os links para as outras partes dessa história. 








            Os semestres passaram tranquilos e sem grandes mudanças em minha amizade com o Gabriel. Só ficamos mais unidos. Ele me salvava em algumas matérias e eu a ele em outras. Éramos grandes parceiros no nosso curso, quase simbióticos. O povo queria muito fazer trabalhos conosco pois a nota era garantida. E alguns convites começaram a aparecer. Festas em repúblicas e algumas baladas. O Gabriel nunca dava a resposta afirmativa e nunca se negava também. Porém em todas que decidi ir, ele nunca apareceu. Quando a festa era na casa de alguém mais próximo ele “dava uma passadinha”, sempre tinha outro compromisso. Via a todos, beijava o rosto das amigas e ia até o dono ou a dona da festa e se desculpava e logo partia. Mal me via, ia lá me dar um abraço caloroso. Mas nunca comentava para onde iria depois. E para minha maior tristeza, nunca me convidava para ir.

            As féria de julho foram normais. Mesmo sem nos ver nas aulas um ligava para o outro para um convite para fazer algo, um cinema, um lanche, pizza no shopping. Fiquei surpreso quando pouco antes das férias ele comentou de sua viagem:

            - Cara não queria viajar essas férias!

            - Nem sabia que ia viajar. Para onde vai? – Perguntei quase me convencendo que não estava interessado em saber.

            - Escócia! – Ele disse como se fosse algo bem ordinário aqui do lado.

            - Nossa! Escócia na Europa? – perguntei o óbvio como se fosse extraordinário.

            - Sim! – e rindo de minha cara completou – E tem outra na Ásia?

            - Não! – disse meio ofendido – não é isso. É que me surpreende você ir para lá...

            E antes que concluísse outro pensamento brilhante ele me cortou dizendo:

            - Meus bisavós são escoceses –  levantou as sobrancelhas em sinal de justificativa – e estão vivos ainda. Acho que estão com uns cento e cinquenta anos. E meu pai faz questão de ir para lá umas duas ou três vezes ao ano. E me obriga a ir. Consegui escapar de ir lá em julho. 
            - Mas isso é bem legal – disse sinceramente quase pedindo para me levar junto – “muito legal” na verdade. Eu tenho só minha avó por parte de pai. Avó é tudo de bom... Hum, Pelo menos a minha é! Me dá dinheiro, mesmo eu já sendo crescido, faz um monte de bolos e doces e me obriga comer tudo, o que não é nenhum sacrifício. Quase todos os domingos vamos lá na casa dela, quando ela não vem na nossa ou saímos todos juntos para comer em algum lugar.

            Eu continuaria a falar e falar se não visse a cara de desgosto de Gabriel.

            - É Iago, os meus bisavós não são tão simpáticos assim. E minha avó mora aqui no Brasil. Ela brigou com eles e não se falam há anos. Eles são bem difíceis de se tratar. Mau humorados demais. E meu pai sempre foi muito apegado a eles. Minha avó teve meu pai lá, e ficou viúva. Parece que ela culpa meus bisavós pela morte dele. Eu não sei a história direito. Só sei um pouco por ter escutado sem querer uma conversa de meu pai com minha mãe.  Ele veio para o Brasil com uns 10 anos, acho.

            Senti que o Gabriel estava se abrindo mais que o costume e o tranquilizei:

            - Não deve ser tão ruim assim. Eles moram em “Dúblim”? – disse com o acento bem abrasileirado.

            - Não, imagina! – disse desconfortável corrigindo minha confusão de localidades – Dublin é capital da Irlanda. Da Escócia é “Edinburgh” – pela primeira vez ouvi o seu sotaque carregado em uma palavra - Moram bem ao norte da Escócia em  Thurso longe para “carái”.

            E como se quisesse me enfeitiçar concluiu:

            - De onde você achou que vinha esse cabelo vermelho cheio de cachos?  - e passando a mão pelos anéis que formavam fez um balanço na cabeça para frente e eu realmente me senti encantado.


            Só lembro que fui ver onde ficava essa tal de “Turso” e descobri que era muito longe mesmo, bem ao norte.



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