sábado, 30 de maio de 2015

Poltergeist – O Fenômeno - Memória afetiva

Poltergeist – O Fenômeno - Memória afetiva 




         Alguns filmes não são feitos para uma criancinha de 8-10 anos assistir. E Poltergeist – O Fenômeno foi um deles. Porém, como qualquer criancinha dessa idade que tenha nascido entre o fim dos anos de 1970-1980, quando via as chamadas comerciais na TV eu ficava animado. Seja pela chance de provar que já se é adulto, seja pela história que realmente fisgava todos nós bobinhos. Sim, eu fui um desses bobinhos fisgados. Não digo que fui enganado, mas minha mente infantil não estava preparada para ver tudo o que vi lá: todos os excessos daquela década que somente um filme de terror poderia ter. Por certo que algumas cenas foram cortadas, lembrando que não tinha aparelho de Fita Cassete em casa e só via o que passava no canal aberto. E esse canal, que todos sabem qual é, sempre foi um tanto moralizante, segundo critérios próprios e absurdamente contraditórios.
       

          Mas era o ano de 1986 ou 1988, é muito para me recordar, e este infeliz garotinho, que fui, fez o inferno em casa para todos assistirem juntos o dito cujo. Foi um dos filmes que me fizeram ser o cagão que fui até os 31 anos com o gênero de terror. Eu assumo aqui esse fato. Um dia conto como perdi essa característica. Bom, então formou-se uma “memória afetiva” com as lembranças desse filme. Que foram:
- Como era legal ter uma família “rica” que morava num casão;
- Assombrações são legais até certo ponto;
- Se tudo aquilo aconteceu com uma garotinha indefesa e inocente imaginava o que seria de mim;
- Assombrações são as coisas mais assustadoras que se pode ter em casa;
- Uma árvore morta é pior quando tenta te comer;
- Nunca confiar em armários, pois podem ser um portal para se entrar monstros, assombrações e demais seres em seu quarto;
- Os mesmos armários, que não devemos confiar, podem te engolir para outra dimensão;
- Um brinquedo pode causar mais terror que assombrações, principalmente se for um boneco de palhaço que é quase do seu tamanho;
- Defuntos saindo de caixões, por mais “fake” que sejam, causam uma grande impressão negativa, principalmente quando se mora “na rua do cemitério” há cerca de 10 quadras de distância;
- E que um filme pode ser tão assustador a ponto de não se querer dormir sozinho por meses.

         Essas “memórias afetivas” perduraram por mais de 20 anos. Então imagine que um dia, essas memórias são novamente acessadas com o burburinho de um “remake”, com os efeitos especiais de hoje. Resolvi então me preparar psicologicamente e enfrentar o medo para assistir novamente o filme de 1982. Como não sou uma pessoa evoluída eu voltei a ser cagão, apesar de marmanjo barbado.  Fui assistir e logo o frio na espinha sumiu... E a rizada me pegou de supetão mostrando que os medos infantis nem sempre resistem além da infância. Mas foi justamente isso que me fez gostar mais ainda do Poltergeist daquela década.

         A decepção foi que, ao assistir Poltergeist 2015, para além dos efeitos especiais mais avançados mudaram tanto a história e cortaram tanta coisa que simplesmente perdeu a graça. Tudo ficou pasteurizado para o gosto médio do público. Lógico que quem nunca assistiu ao filme original não terá como comparar. Porém outras produções são mais eficientes em causar a impressão de terror que esta. Só de deslocar a família de um bairro de classe média alta para um de classe média baixa, fazer o pai, que antes era um bem sucedido agente imobiliário, mais um desempregado, já tira a aura de “felicidade” que deixa os acontecimentos mais assustadores. Afinal uma família feliz ser atacada por entidades sobrenaturais nos causa mais compaixão. A família é seca, sem cães, sem pássaros, sem peixes. Os pais são tão caretas que no máximo fazem sexo, ou pelo menos tentam, quem assistiu as duas versões entenderá o que quis dizer. E em momento algum aparecem vizinhos. Isso era bem engraçado e deixava a família mais verdadeira como composição para dar veracidade. Deslocaram as situações do palhaço e da árvore. 

         Colocaram a filha mais velha como uma “patricinha” que é também atacada pela entidade em certo momento. No outro filme a irmã mais velha tinha mais atitude, a ponto de em uma cena com os “pedreiros” da casa, que começaram a se “engraçar” com ela, simplesmente os manda “tomar no khóh”, com gestos “chicanos” de uma forma bem atrevida. Só que agora a cena ficaria uma ofensa ao politicamente correto... ARRG!!! O politicamente correto é o que mais pasteuriza os filmes de Hollywood, deixando-os chatos!!! Como se o povo de verdade fosse politicamente correto... Duplo ARRG!!

         E a piscina? Não teve piscina, com a mãe caindo na lama e os caixões emergindo com corpos velhos e murchos pelo tempo pulando para fora. Tudo bem que hoje a cena antiga fica cômica, mas dá um charme bem peculiar. 


       E o desfalque imperdoável foi mudarem a ideia da vidente Tangina, interpretada pela icônica Zelda Rubinstein, por um idiota (Jared Harris) que faz programas na televisão de caça-fantasmas. Há momentos bons? Sim, bem poucos. 

                 
Por exemplo, a garotinha Madison (Kennedi Clements) é bem fofinha e tão linda e inocente quanto a Carol Anne (a finada Heather O’Rourke), até menos robotizada e de cabelos castanhos. E deslocar a importância da mãe (Rosearie DeWitt) para o filho do meio (Kyle Catlett) foi uma forma bem interessante de adaptar o roteiro, porém não necessariamente o mais acertado. Sem contar a maldita necessidade de se mostrar o que acontece dentro do portal onde a garotinha está, nem sempre mostrar é o melhor. Quando irão aprender isso? 

         Não vejo grandes destaques para as interpretações de 2015. O grupo de 1982 foi muito canastrão e essa era a graça em uma produção desse tipo. Esta versão nova tentou-se levar muito a sério. Nem sempre “remakes” dão certo. Esse foi mais um que não deu. Preferia ter ficado somente com minha “memória afetiva”, toda destorcida, de uma criança, do que ter essa noção de um filme mediano de adulto.  Entre o rocambolesco filme do século passado e o recente, o do século passado continua sendo, no mínimo, mais divertido. E olha que não sou um saudosista... Muito pelo contrário. 



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