quarta-feira, 29 de junho de 2016

O Escaravelho do Diabo - Adaptação que Tinha Tudo Para Dar Certo...

O escaravelho do Diabo - Adaptação que Tinha Tudo Para Dar Certo...





         Aqui temos um grande exemplo de adaptação de livro que tinha tudo para dar certo e não dá.


         O livro fez parte da vida escolar de inúmeras pessoas nos anos de 1980-1990. Alguns, como eu, nutriram um carinho especial por “O Escaravelho do Diabo” dar a sensação de ser um livro para “gente grande” pois era cheio de mistério e mortes. No fundo a narrativa era simples e o mistério englobava uma situação que representava muito o estilo de ser brasileiro no quesito investigação: o caso foi arquivado e por acaso o personagem principal descobre o assassino depois de um tempo, dando a entender que nossos “investigadores” não eram tão astutos quanto um Sherlock Holmes, Hercule Poirot ou um Jules Maigret.


         O livro foi escrito pela autora mineira Lúcia Machado de Almeida que contava também com outros livros icônicos. Porém, o filme, produzido por vários produtores e co-produtores, fica bem a baixo da simplicidade instigante do livro. Ao tentar adaptar o mistério, que envolve assassinatos de ruivos que recebem pelo correio caixas com escaravelhos que possuíam um nome científico que prenunciava o modo que iam morrer, os roteiristas se perdem tanto que é difícil conseguir extrair algo de bom. Ao transformar o personagem principal em um pré-adolescente eles colocam o mesmo em situações tão absurdas que nem o “Guia do Mochileiro das Galáxias” conseguiria imaginar. Um grande exemplo é o garoto, que nem tem buço na fuça, pegar a moto do irmão que morreu, um modelo de motocross, e ir ao encontro da sua amada. Conseguindo acha-la no exato momento que o assassino tenta cortar o pescocinho da moçoila. A cena fica mais grotesca se prestarmos atenção na chuva mais falsa que eu já vi na vida. Até a chuva de “Dançando na Chuva”, que foi totalmente executada dentro de um estúdio, consegue passar mais verdade que a deste filme. E outra coisa duplamente absurda é perceber que o ator mirim é tão baixo que jamais conseguiria montar na motocicleta, sem contar a dificuldade de dirigir algo tão grande.


         As interpretações são outro desastre. O “menos pior” só o é por aparecer pouco no filme. O casalzinho de protagonistas até que é fofo, mas o desenvolvimento da relação é rasa demais. Os personagens secundários, foram escalados alguns nomes conhecidos de nossas novelas, são insossos. Até uma premissa do investigador possuir um mal que afeta a memória seria interessante se empregado com mais maestria.  Pena que o recurso se perde. Não se dá para perceber qual a intenção dessa situação, se é cômica ou se é dramática. Entre uma intenção ou outra não ficamos nem lá nem cá.





         É triste. Cada dia que passa menos interesse me causa as obras cinematográficas nacionais. Tem que se garimpar muito ou esperar grandes estiagens criativas para se ter uma obra que valha. Adoraria muito poder dizer o contrário. E o dia que assistir um bom filme nacional terei enorme satisfação em comentar aqui. No mais, muitos filmes parecem ser apenas confeccionados para passar na Sessão da Tarde da Globo. 




quinta-feira, 23 de junho de 2016

Lanche MacDonald's ou Coq au Vin? - Sim é um comentário sobre filme

Lanche MacDonald's ou  Coq au Vin? - Sim é um comentário sobre filme








Antes de mais nada, isso é sim um comentário sobre filme. Só que através de uma analogia.

    Estava pronto para escrever uma resenha sobre uma série que comecei a acompanhar quando neste fim de semana eu resolvi assistir dois filmes que se mostraram tão diferentes, mas tão diferentes, que foi inevitável não querer falar do abismo entre os dois.


        De cara eu já fiz uma analogia entre um lanche MacDonald’s e um Coq au vin (Frango ao vinho). Propositalmente escolho as iguarias dos respectivos países: EUA e França. Pois simbolicamente foi o que senti ao terminar os dois filmes. Estou fazendo um certo suspense pois, reparem que nem no título coloquei os nomes dos filmes, quero muito passar a sensação que tive. E como “gordinho” que sou, que só pensa em gordices, a comida representa bem o que quero passar. Então pense nos dois pratos.
A grande maioria das pessoas, talvez induzida por uma estratégia de marketing mundial, acha o lanche americano muito prático e gostoso de se comer. É algo que sai rápido e tem um sabor agradável principalmente para crianças. Fica pronto em 5 minutos e se come em 10 minutos. Caloricamente falando é uma bomba, muitas calorias, muito sal e gordura, e proporcionalmente poucos nutrientes. Alguns podem até torcer o nariz para ele, porém, um adulto com menos de 50 anos, de cidade um pouco maior, cresceu e se criou comendo vez ou outra um belo “Big Mac” ou um “Quarteirão de Queijo”, não generalizando, sei que existem exceções. Por sua vez, um Coq au Vin é um prato tido como sofisticado. Tem origem francesa, dizem até que foi criado para o Imperador Júlio Cesar, com galos mais velhos e o vinho seria para amaciar a carne dura. Deu que a mistura ficou gostosa e com o tempo galgou a um patamar mais elevado pela índole francesa de aperfeiçoamento e o prato virou um clássico. Com sabor característico, acentuado pelo vinho, acaba por agradar também a grande maioria. Porém, o marketing foi mais “discreto” e com o tempo ganhou sua reputação pela aura de sofisticação, apesar de ser apenas galinha cozida no vinho. Ao contrário do seu oponente americano, ele é mais proporcional no equilíbrio calorias versus nutrientes. E uma certeza: o Coq au Vin dá muito mais sustância que o MacDonald’s. A idade das iguarias cinematográfica também conta, um é recente, o outro, remonta a data longínqua do milênio passado, 1967.
O filme americano é relativamente jovem diante do francês. Assim como as iguarias se comparadas, “Mac” surge em 1955 e Coq au Vin por volta do ano 10 a.C (não há registros provando data certa). E assim como as iguarias que levam carne bovina, farinha, alface, queijo, cebola e pepino em conserva para um e para o outro vinho e carne frango, cebola, cenoura, tomilho, louro, alho, sal e pimenta, os materiais em si dos dois filmes são relativamente simples e fáceis de achar, estão no imaginário popular de nossa cultura. O que vai diferenciar os dois será a feitura. Nas mãos de americanos práticos e ávidos de lucro, onde tempo é dinheiro, o produto atinge um processo de produção industrial em série para compensar a necessidade de mercado que a procura acarreta. Produto pronto é comercializado de forma padronizada aos milhares pelo mundo. Tanto que se for ao Japão e ao Canadá no mesmo dia e pedir o mesmo lanche nos dois lugares o sabor e forma será similar nos dois países que são totalmente diferentes em suas culturas. Porém, um Coq au Vin vai depender mais do cozinheiro que tomar seus ingredientes.
Coisas relativamente simples que misturados da forma certa e com técnica pode ser apenas mais um prato de frango com vinho ou se tornar uma delícia inigualável e memorável, único. O que é o caso do filme francês. Virou clássico pois estava nas mãos certas e hábeis de um grande “chef” que por ironia não era desse país.

        E assim que acabei de assistir ao primeiro eu fiquei empanturrado, estufado, com um gostinho gostoso, que logo se desvencilhou num arroto de gás de refrigerante, e meia hora depois já estava de novo com fome. Logo esqueceria. O outro, o sabor da iguaria ficou profundamente marcado, não só nas papilas gustativas, na memória que se formou diante da experiência.
O sabor foi mais profundo e duradouro. Horas depois ainda voltava a refletir sobre uma nuance de sabor que se difundiu pelos meus neurônios. Um filme logo vai ser esquecido, há outros milhões produzidos em série com o mesmo sabor. O outro, o chef foi único e nunca mais produziu algo igual. Sua obra é única e por mais que outros copiem, nenhum chegou aos pés do original...

        Bom, já houve muito suspense hora de revelar os pratos, no caso, os filmes. A mesmice americana foi “O Caçador e a Rainha de Gelo”, elenco estelar que poderia ser utilizado com maestria, mas que só foi realizado para suprir “demanda de mercado”.
Nada de novo, roteiro simples que tenta mostrar um visual bacana. Direção burocrática. Para piorar o resultado final, usa um desenho infantil de sucesso recente como muleta para se projetar. Refiro-me a “Frozen”. O outro, denso em roteiro e com interpretações marcantes de um elenco proporcionalmente estelar em seu país de origem.
Sem explicações fáceis, sem julgamentos moralistas: “A Bela da Tarde” de Luis Buñuel. Claro que não é uma comparação justa. Porém coincidiu dos dois filmes serem assistidos quase que simultaneamente e não houve como fazer uma comparação. São filmes antagônicos, um mercadológico o outro autoral. Tenho certeza que se a intenção dos realizadores de “O Caçador e a Rainha de Gelo” fosse mais comprometida com a qualidade a história seria magnífica. Contudo é só mais um enlatado que me fez pensar muito sobre o motivo de se consumir “junk food” quando temos “alimentos” saudáveis e saborosos ao nosso alcance. Novamente aqui aparece a analogia da comida. Acho que ando com fome...

        Por certo que não dá para comer o tempo todo um Coq au Vin e que em certos momentos um MacDonald’s acaba por ser bem-vindo. Dosar é sempre o caminho mais sensato.
O extremismo em qualquer setor da vida pode gerar alguns desconfortos, seja a nós mesmos, seja aos outros. Ficar apenas nos “clássicos” nos torna anacrônicos, pessoas exóticas que não conseguem dialogar com o novo. E ficar só na “novidade” faz nossa vida um pouco mais pobre e superficial sem referências. Enfim, já disseram que o caminho do meio é o melhor. Hora ou outra acabamos desequilibrando a balança, porém é bom sempre se atentar


segunda-feira, 6 de junho de 2016

Séries: Grace & Frankie: Uma pérola

Grace & Frankie: Uma pérola




        Dois fatores tornariam essa série espinhosa há alguns anos. O primeiro deles, o mais óbvio, é tratar do tema da homossexualidade e o segundo, não menos óbvio, é sobre a questão da terceira idade. Ambos os fatores são tratados com delicadeza e humor. E foi o reavivamento da qualidade das produções televisivas que nos deu as inúmeras pérolas como esta que comento.


        Grace & Frankie é uma produção da Netflix, que já proporciona uma qualidade ímpar na história. E para dar mais brilho a essa joia, um dos criadores não é ninguém menos que Martha Kauffman. Não sabe quem é Martha Kauffman???? Bom, entre outras criações ela tem uma série que quase todo mundo já assistiu pelo menos um episódio na vida, ou ouviu a chamada, ou ama, ou odeia, a grande maioria ama: Friends. Isso mesmo, Friends é criatura dessa distinta pessoa Martha Kauffman. Para melhorar ainda a expectativa Tate Taylor divide a direção. Ele simplesmente foi o diretor e roteirista de um dos filmes mais simpáticos da última década “Vidas Cruzadas” que conta a vida de empregadas domésticas negras no Mississipi nos anos de 1960 com as ótimas Viola Davis, Octavia Spencer e Emma Stone.

        Percebeu que o naipe do baralho está bem alto? E melhora. No elenco temos duas ótimas atrizes que já trabalharam juntas nos anos 1980 no divertido “Como Eliminar Seu Chefe” , pouco vistas ultimamente, e imagino devido à idade: Lily Tomlin e a oscarizada Jane Fonda. Gostaria muito de uma participação especial ou mais que especial de Dolly Parton para completar o trio, porém, ainda não aconteceu.
E há ainda o elenco de apoio competente encabeçado pelos veteranos Martin Sheen e Sam Waterston, este último mais conhecido na televisão.

        No primeiro capítulo da primeira temporada já temos o acontecimento que vai motivar toda a temporada: o divórcio dos dois casais Grace e Robert (Fonda e Sheen) e Frankie e Sal (Tomlin e Waterston). Os dois maridos chamam as esposas para um jantar num restaurante chique e comunicam que estão se separando pois são amantes há 20 anos. Ambos estavam casados com suas esposas há 40 anos. E depois disso acompanhamos o desdobramento das angústias, inseguranças e o sofrimento, principalmente, das duas esposas “traídas”. Para piorar, ou melhorar, Grace e Frankie acabam morando juntas na casa da praia que os casais mantinham. E para piorar mais ainda, ou melhorar mais ainda, Grace é o oposto de Frankie.

A primeira é bem sucedida dondoca dona de uma empresa de cosméticos que está passando a bola para a filha e a outra é uma riponga que ainda fuma maconha em várias situações e faz rituais xamânicos para purificação espiritual. Detalhe, se vocês fizeram as contas, nenhum dos personagens possui menos de 70 anos. Sim, são personagens que estão no ocaso da vida, mas tem tanta vida pela frente que resolvem deixar convenções sociais para trás e decidem trilhar um novo caminho em busca da felicidade que lhes foi negada. Pelo menos os dois personagens masculinos pensam assim. As duas personagens femininas são obrigadas a se reinventarem.


        A história poderia ser um dramalhão dolorido, mas nas mãos de roteiristas hábeis, se torna em vários momentos uma deliciosa comédia, ou uma tragicomédia.

        Os “70 anos” é uma idade em que a maioria das pessoas já sossegaram o facho. Estão aposentadas, ou só trabalham por prazer, caso não sejam pessoas brasileiras de classe mais baixa. Como os personagens são americanos então já estão na fase de desfrutar de uma aposentadoria ou de uma vida menos desacelerada. E algo que nossa sociedade nega é a sexualidade de pessoas acima dos 65 anos, que por sinal, existe. Então não espere velhinhos fofinhos que ficam tricotando e lendo jornais. Eles vão à luta no amor e no sexo. Tanto que o motor da trama é o divórcio de dois homens que querem se casar aos 70 anos.    

        Outra coisa é que os atores possuem a idade que aparentam. Não foi contratado nenhum ator ou atriz de 50 anos para ser uma pessoa de 70. Com diferença de um ou dois anos o quarteto principal possui essa faixa etária. E mesmo a linda e conservadíssima Jane Fonda não passa por menos idade. E isso é um alívio em época de plásticas que desfiguram a velhice de forma bizarra. Não que Tomlin e Fonda não tenham nenhuma intervenção. Elas têm. Mas não estão desfiguradas. E isso traz um charme todo especial.

        A primeira temporada trata do trauma e do constrangimento que todos são obrigados a lidar. Já a segunda, período de um ano transcorrido, eles estão já conformados e encaminhados para seus respectivos destinos. Apesar de ainda manterem um certo cordão que os liguem e que dificilmente será cortado.


        A série diverte e enternece. É um refresco diante de tanto rostinho novinho e bonitinho. As interpretações são inspiradas, Tomlin ganhou uma indicação ao Globo de Ouro de Melhor Atriz de Comédia. E bem indicada. Mesmo não possuindo um roteiro mirabolante como outras séries de sucesso na moda. No mais é só diversão garantida. Aproveitem.