quarta-feira, 12 de agosto de 2015

What Happened, Miss Simone? - Apontamentos após assistir o documentário

What Happened, Miss Simone?- Apontamentos após assistir o documentário





         Meu primeiro contato com Nina Simone foi através do filme “A Assassina” (1993). Além dela fazer parte da trilha sonora era também inspiração para o codinome da assassina vivida por Bridget Fonda: Nina. Gostei do filme, mas gostei mais das migalhas de música de Miss Simone que nos eram lançadas. Era outra época, a internet não tinha chegado ainda aos sertões e rincões do interior do Estado de São Paulo e logo arquivei em minha memória aquela cantora. Passou alguns anos e novo filme me chamou a atenção, não só pela história, mas por uma das músicas que estava em sua trilha sonora. O filme era “Beleza Roubada” (1996) de Bernardo Bertolucci e lá, entre tantas músicas ótimas, Miss Simone com a icônica “My Baby Just Cares For Me”. Como trabalhava numa locadora, que logo começou a vender CDs, tive a oportunidade de escutar várias vezes essa música. O tempo passou e, novamente sem internet, continuei a vida. E esqueci de Miss Simone.

         Porém, toda vez que ensaiava uma lista de cantoras que mais gostava, eu lembrava dessa mulher que eu nem sabia ainda que rosto tinha. Até que um dia, já não morava numa cidadezinha de interior, lembrei-me dessa cantora. Aproveitei a internet, que já possuía com mais facilidade e descobri o rosto da diva. E o mais importante, descobri outras músicas. Fui criando afeto por aquela voz grossa e baixa. E a cada música que ouvia mais eu gostava.


         Existia duas lacunas na minha história com Nina Simone. A primeira era o limite linguístico. Não sabendo inglês não entendia o que ela cantava. Logo, isso foi superado com os sites que davam a música traduzida. E me encantei mais ainda.

         A outra lacuna era a contextualização de sua vida. Sabia pouco sobre ela. Sabia que era uma importante cantora do “circuito” alternativo americano. Sabia que era respeitadíssima, sabia que em algum momento de sua vida se tornara ativista. E, falha total minha, me contentei só com isso. Vez ou outra escutava suas músicas e estava tudo bem.

         Até que ela morreu em 2003 e aquilo me partiu o coração. Como bom católico que era, até rezei em intenção à sua alma. E pesquisei um pouco mais da sua vida.

         E vergonhosamente, só agora, com o documentário do Netflix “What happened, Miss Simone?” que eu me inteirei o suficiente. Para mim a diva cantora era só um ícone de veneração. E a surpresa foi constatar que ela era bem humana. Humana até demais. Com limitações tão constrangedoras como constatações de que ela ainda continuava sendo diva. Não mais a diva idealizada, mas uma diva humana. Com erros e com acertos. Descobri como foi sua infância pobre, como enfrentou o fato de ser negra e sofrer preconceito. Como se iniciou sua genialidade com o piano e depois como, novamente devido ao preconceito, não pode realizar um sonho. Logo descobri como casou, como começou a ser reconhecida e como teve uma filha, como se amorteceu na segurança do sucesso e como tudo isso a sufocou. E como um evento nefasto a colocou no ativismo pelos direitos civis dos negros compondo uma música forte “Mississippi Goddam”. Como ela conheceu pessoas interessantes e caminhou até Selma com eles. Era amiga de Martin Luther King, compôs uma música quando ele foi assassinado. Foi amiga de Malcom X e tantos outros ativistas de sua época. Pagou um preço por sua ousadia política e, renegada pela indústria, desceu ao inferno pessoal. Com a ajuda de amigos se levantou e continuou sendo quem sempre foi, uma diva da música americana, um dos melhores expoentes de sua geração musical.

         E que bonito foi descobrir tudo isso e recordar das músicas percebendo o que havia por trás de cada acorde, de cada verso, de cada refrão. A beleza que sentia em sua voz carregada de uma certa tristeza tomou profundidade após me contextualizar. Fiquei totalmente pasmo com o que realmente era a voz que ouvira pela primeira vez em 1993. Uma profundidade adquirida com a vida, com a alegria, com a tristeza e com a inteligência de uma mulher que ousou pensar, falar e cantar o sofrimento do seu povo e pagou o preço de ser quem foi: Nina Simone.




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