quinta-feira, 15 de agosto de 2024

No interior de São Paulo: conversa torta

No interior de São Paulo: conversa torta Por várias questões estou aqui, numa cidade que eu não caibo mais, que eu nunca me identifiquei e que tento ao máximo me desenraizar. Agora, após o falecimento de minha mãe, talvez consiga, por mais que fique meu tio, tia e meu primo aqui eles não são tão próximos. O que tem ainda é uma propriedade, onde estou morando, que pretendo vender o mais rápido possível. Enquanto não acontece vivo aqui cuidando de mim, sem teatro, sem lugares badalados, sem grupos sociais que me identifico, sem lugares que gosto de ir para me divertir, sem shows de cantores interessantes, sem conversas acaloradas de temas que me empolgo. Pouco converso aqui, o restante da família de forma esporádica para manter a convenção social. Um casal que tinha uma quitanda aqui perto, agora estão com uma casa de churros. Alguns clientes desse lugar que acabo por conversar e um amigo ou outro que aparece do vácuo que deixei pela minha longa temporada longe daqui. No geral, tentam não abordar temas espinhosos. Contudo, os temas não espinhosos são torturosos. Para sentir o nível, vou contar uma pequena hediondice que presenciei. Estava com meu tio na esquina de casa, meu tio tem o costume de ficar sentado na mureta de uma consultoria agrícola aqui do lado. Costume de anos, antes ele fazia uns percursos pelos bares e finalmente resolveu abrir, como ele mesmo diz, seu escritório ali. Numa manhã de domingo, precisei falar com ele, e fui lá. Conversa vai, conversa vem, aparece um e outro, que do mesmo jeito que chega se vai. Até que, um senhor, com uma postura envergada pela falta de cuidado com o próprio corpo vestindo uma calça marrom, com um sapato mais surrado e uma camisa que um dia foi nova, mas estava limpa. Dizia que estava indo comprar a mistura do domingo, atravessando a rua havia um açougue. Até este momento, eu não tinha interesse algum nele, o que não era um desaforo, era só uma circunstância. Não conhecia ninguém, e ninguém se dirigia a mim além do cumprimento de educação, eu também não fazia esforço de tentar engajar uma prosa. O que ouvi fez eu prestar atenção de uma forma não confortável: “Dinho! Dinho...” - Só lembrando para carregar no erre retroflexo, pois estamos no interior, e coloque na sua leitura uma pegada de sotaque bem caipira, mas não das novelas da Globo que tem um coach de sotaques horroroso. Enfin, tentem o que puderem - ” Dinho, quer aprender uma simaptia pra deixar a muié que você quiser no cio?” Eu acho que até meu tio se espantou com aquilo pois não esperava ter ouvido o que ouviu e deu um sinal de falta de entendimento: “Eu disse se você quer que te ensine uma simpatia pra uma mulher fica no cio.” “Que mulher?” “A que você quiser, você pode escolher. Ela vai ficar no cio pra você poder comer depois...” Meu tio mostrou um pouco de embaraço mas tentou levar no bom humor, afinal era um conhecido seu e ele sabia lidar com aquilo. Em compensasão eu estava chocado e quase pulando no pescoço do homem. E meu tio percebeu e tentou desviar o assunto mas o homem estava muito interessado em passar a simpatia. “Então, Dinho, você tem que achar uma cadela no cio. Não pode ser outro tipo. Você pega uns pelos da cadela ...” “Não pode ser de cachorro macho?” - interferiu meu tio. “Não, não pode.” - Disse o homem sério. - “Veja bem, você pega os pelos de uma cadela no cio e joga no quarto ou na sala que você sabe que a mulher vai estar...” Deu uma pausa dramática e meu tio emendou: “E se aparecer um homem....” “Aí você se vira com ele.” - Rebateu animadamente o homem - “Mas garante que seja a muié, senão você vai ter que comer o homem...” “E se ele quiser me comer?” “Aí é problema seu.” E riu o quanto pode mas continuou - “Aí dá certinho viu, jogou o pelo de cadela no cio no lugar que a muié estiver ela entra na hora no cio e vai querer dá pra você.” E meu tio emendou desdenhoso: “E aí? O que faço quando tudo isso acontecer?” “Você come a muié, uai! Ela vai ficar com uma vontade e vai querer dar para você” “E se aparecer outro? “Tem que tomar cuidado senão ela dá para o outro.” - Seu tom foi de gravidade sobre a possibilidade. O jogo de infantilidade machista continuou com mais zombarias da parte do meu tio e o homem justificando e explicando de forma séria o que sabia... Eu só estava mudo... De boca aberta não acreditando no que ouvia. E com certeza ficou muito evidente meu desagrado pois meu tio me olhava e em certo momento ele resolveu mudar tão repentinamente a conversa que o cara ficou no vácuo e meu tio não deu brecha para voltar ao assunto. O homem deve ter se tocado, pois me olhou desconfiado e logo proferiu uma desculpa sem graça e foi buscar sua carne no açougue. Quando já tinha atravessado uma rua eu virei para meu tio: “Como assim? Ele realmente acha que uma mulher entra no cio com uma simpatia dessas? Ele nem tem cara que consegue nada com ninguém e ainda mais dessa forma tão escrota?” Entendendo minha indignação mas não querendo prolongar o assunto continuou a falar de outra coisa. Logo depois quem se despediu fui eu. Até hoje, já se passou semanas, quando eu esbarro nesse homem que mora no caminha para a academia, eu sinto uma certa pena e um mal estar no estômago. E de birra, não o cumprimento. E como a vida não está fácil para ninguém, principalmente para quem quer viver de seus conteúdos, e eu só escrevo e não faço vídeos para Tik Tok ou Intagram (sou todo vergonhoso), mas infelizmente acho que vai ser o jeito reconsiderar... Enfim, quem quiser contribuir com qualquer valor, segue a chave pix, que é meu e-mail, pelo Banco Inter e está no meu nome Vinícius Motta: Pix - vinimotta2012@gmail.com.br

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